
A vida inteira juntei cacos.
Juntava pedacinhos das famílias dos meus amigos, das séries e filmes para ter minha tão sonhada família.
Não tive avó. Não tive avô.
Não tive pai.
Éramos minha mãe, meu irmão e eu.
Meu irmão se foi.
E não tem caco suficiente no mundo pra fechar o buraco que ficou.
Somos minha mãe e eu.
Tenho muito medo do dia que serei só eu.
Com quem vou falar que estou com medo?
O subúrbio é dentro da gente
A série "O subúrbio é dentro da gente" tem esse título inspirado na obra Grande Sertão: Veredas de Guimarães Rosa, em que ele diz que o sertão é sem lugar, o sertão é do tamanho do mundo, o sertão é dentro da gente, o sertão é uma espera enorme - a sensação que eu tenho, nascida e criada no subúrbio, é que o subúrbio é sem lugar, mas o subúrbio é do tamanho do mundo! E independente de onde estejamos agora, o subúrbio É (e sempre será!) dentro da gente, mas o subúrbio ainda é uma espera enorme...
Contrariando as imagens veiculadas nas grandes mídias e que pairam no imaginário popular da alta classe carioca sobre o que é o subúrbio, eu busco apresentar um subúrbio repleto de amor, saudade, cores, vida, cultura. Crescer no subúrbio tem seus desafios, afinal, só quem vê de dentro a margem, sabe a real profundidade do rio... Mas também tem muita alegria, família aos domingos e cultura.
Meu trabalho é sobre isso, apresentar um subúrbio repleto de afeto.


























Domingo deveria ser considerado o dia do subúrbio.
É domingo o dia que voltamos.
É domingo que tem cheiro de café e pão com manteiga, louro no feijão e lanche da tarde.
É domingo que tem preguiça, memória e afeto.
É domingo que a família se reúne, que os primos tramam confusão, que a mesa fica posta por horas, repleta de histórias de infância e risadas.
É domingo que lembramos porque somos como somos, de onde viemos e quem são os nossos.
E é, justo no domingo, que dá aperto no peito do fim do dia.
Lembrar de onde viemos ajuda muito a não perder o rumo, afinal, quem vê de dentro a margem, sabe a real profundidade do rio.
Por ser de lá
Uma coisa sempre me chamou muita atenção em uma foto da minha mãe com seus pais e meu tio: a família dela não era a minha família. Meus avós morreram quando eu era muito nova e meus tios se afastaram. Minha família gigantesca se reduziu a um núcleo familiar de três pessoas.
Cresci com o desejo de casa cheia, tal como minha mãe falava que era a casa dos meus avós: "Mesa posta o dia inteiro, entra e sai de gente que as vezes eu nem conhecia e sempre tinha café da garrafa. Não cresci com luxo, mas seu avô não deixava ninguém ficar com fome".
Neste ano comecei a procurar apartamento para comprar e a cada quatro apartamentos que visito, ao menos um deles tem fotos abandonadas. Álbuns inteiros, festas, primeira comunhão, casamentos, formaturas... tudo largado pelos cantos, levado pelo vento. Passei a fotografar as fotos abandonas nos apartamentos e construir, a partir delas, o meu próprio álbum de família, mesclando histórias que conheço, que sonho e que invento.








